segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Sonho #43

Estava deitado na relva. Sentia-te por entre o sol, ou o sol por entre ti. Talvez mais isso até. Estavas tão perto e tão clara. Como uma fotografia, estavas com cara de fotografia. Tenho essa imagem gravada em mim, é estranho. Dobraste-te para as tuas mãos, eu perguntei
-Em que pensas?
Paraste, respiraste. Respondeste
-Em como é tão bom estar contigo.
-Também gosto muito de estar contigo.
Disse eu, mais baixo. È o que faço quando respondo a essas coisas, a minha maneira de ser envergonhado.
Não sabia o que te dizer. Não sei se alguma vez soube, se alguma vez saberei. Nada parece ter lógica, nada é certo o suficiente. Se deus quiser, continuará assim. Mas tem piada, agora tenho tempo para te dizer outras coisas. Para te explicar outras coisas, como
-Gosto tanto dos teus lábios.
Ou
-O teu cabelo cheira a ti.
E essas coisas parecem tão distantes de mim e de ti. Lembram-te, mas não é isso que somos. Isso são as explicações, as nossas explicações. Importantes também. Bonitas quando estão perto, distantes parecem pormenores. Que escapam do mais importante, do que nós somos. Da nossa explicação
-Gosto de ti.
E não é o que eu disse, é o que me apetecia dizer. É o que me passava pela cabeça, a única coisa que tinha lógica. O resto era tão fútil e nós aprendemos isso. Tudo o que dissemos, tudo o que não era
-Gosto de ti
Não tinha lógica. Eu fazia uma afirmação e tu concordavas e podia ser o mais tonto possivel. Era só uma forma de preenchermos o ar que estava entre nós. Uma forma de não dizermos
-Gosto de ti.
Até que disse
-Porque sorris?
Porque sorrias, outra vez, dobrada sobre as tuas mãos. As tuas unhas vermelhas. Disseste.
-Em como há gestos tão dificeis de fazer.
E eu larguei a cabeça da relva, do meu apoio. Beijei-te a testa, duma forma desejeitada. Beijei-te os lábios de uma forma desejeitada. Quando me afastei vi-te por entre o sol, clara com cara de fotografia.